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O setor agrícola da Argentina finalmente começou a reverter o declínio iniciado no governo de Cristina Kirchner e voltou a chamar a atenção de investidores estrangeiros com os primeiros sinais de retomada sustentada da economia do país. O diagnóstico é de María Beatriz Giraudo, presidente honorária da Associação Argentina de Produtores e coordenadora de Políticas Públicas para o Desenvolvimento Sustentável do Ministério da Agroindústria do governo de Mauricio Macri.
“Há apenas dois meses começamos a ver sinais de melhora na economia argentina e, com isso, notamos o retorno do interesse ao setor agrícola do nosso país”, disse ela ao Valor em recente passagem por São Paulo. “Há um interesse, sobretudo de alemães e [outros] europeus”. Segundo María Beatriz, as sondagens têm se concentrado em projetos que envolvem a agregação de valor a produtos agrícolas.
Mas a recuperação da produção no campo argentino em si, sobretudo na área de grãos, também alimenta o otimismo da líder rural. Após uma intricada relação com o governo de Cristina Kirchner, a retirada dos impostos de exportação que incidiam sobre o milho e o trigo do país pela atual gestão e o clima favorável poderá gerar uma safra de grãos de até 130 milhões de toneladas já nesta temporada 2017/18. A expectativa da Associação Argentina de Produtores é que a safra de grãos do país alcance já no próximo ciclo (2019/20) a marca de 150 milhões de toneladas. Antes da retirada dos impostos incidentes sobre milho e trigo, estimava-se que esse patamar só seria atingido em 2025.
Dados do USDA mostram que, impulsionada pela desoneração, a produção de trigo do país vizinho cresceu 63% em 2016/17 na comparação com o ciclo anterior, para 18.4 milhões de toneladas. Na mesma comparação, as exportações do país, a maior parte destinada ao Brasil, cresceram 35%, para 13 milhões de toneladas. No caso do milho, a colheita aumentou 41% de 2015/16 para 2016/17, para 41 milhões de toneladas, e as exportações registraram incrementos de 18%, para 25.5 milhões. Diferentemente do que ocorre no mercado de trigo, no qual o Brasil é o mais importante cliente da Argentina, no de milho os dois países são concorrentes. Segundo analistas, o avanço dos embarques brasileiros nos últimos anos foi inclusive facilitado pela crise no vizinho.
Essa concorrência entre os sócios do MERCOSUL também tende a voltar a ficar mais aguda no mercado de soja em grão, carro-chefe do agronegócio brasileiro. Isso porque a Argentina dará início em janeiro a uma redução mensal de 0,5% da alíquota que ainda incide sobre a exportação da oleaginosa, hoje equivalente a 30% do valor de venda. Mesmo com a taxa, e porque trigo e milho também eram onerados, a Argentina não perdeu nos últimos anos a terceira colocação entre os maiores exportadores de soja do mundo, atrás de Brasil e EUA. Mas a expectativa é que a produção volte a aumentar em ritmo mais forte com a redução da alíquota. “Com a retirada das taxas sobre milho e trigo, a área de plantio de soja deve cair na Argentina na safra 2017/18. A tendência, contudo, é de reação já a partir de 2018/19”, disse Ana Lodi, analista da consultoria INTL FCStone no Brasil. Boa parte dessa perda de área da soja nesta safra é para o milho. Conforme divulgou ontem o Ministério da Agroindústria do país, a área de milho deverá chegar a 8.9 milhões de hectares, 5% mais que em 2016/17, e a colheita do cereal tende a se aproximar de 50 milhões de toneladas. A Pasta não divulgou projeções para a soja, que em 2016/17 ocupou 18 milhões de hectares na Argentina, a colheita atingiu 55 milhões de toneladas, segundo as estimativas oficiais.
No caso do trigo, aparentemente a reação argentina já chegou ao limite, até porque o mercado global tem apresentado superávits nos últimos anos. Tanto que, para a safra 2017/18, a projeção do ministério é de queda de 6,8% da área, para 5.9 milhões de hectares. E a colheita poderá cair na mesma proporção. Segundo María Beatriz Giraudo, a intenção do governo Macri é que a Argentina também se recupere em outros dois mercados perdidos em consequência das políticas públicas passadas, sorgo e girassol. Com ajuda do setor agropecuário, mas também dos crescimentos nas áreas de construção e energia, a Argentina deverá encerrar 2017 com crescimento do Produto Interno Bruto (PIB) de 2,7%, a maior expansão em seis anos. Só o setor agrícola deverá registrar incremento de 8%, contra retração de 5,7% em 2016. María Beatriz disse, ainda, que novas medidas do governo Macri são esperadas para beneficiar o campo. A expectativa é que a Casa Rosada apresente no fim do ano uma proposta de reforma trabalhista para reduzir custos e alavancar a competitividade da “porteira para dentro”.
Fonte: VALOR