Abastecimento dos navios iranianos no Porto de Paranaguá deveria ser feito em alto mar via embarcação da Petrobras.| Foto: Cláudio Neves/ Portos do Paraná
Os exportadores de milho brasileiros foram pegos de surpresa com a decisão da Petrobras de não abastecer navios de bandeira iraniana nos portos do país. A decisão, segundo a empresa, é em razão das sanções impostas pelos EUA ao país do Oriente Médio. Dois navios estão retidos desde o início de junho no Porto de Paranaguá (PR) aguardando abastecimento. Um deles está carregado com 48 mil toneladas de milho e deveria ter levantado âncora no dia 8 de junho. O outro aguarda para receber combustível em Paranaguá para poder rumar ao Porto de Imbituba (SC) onde receberá a carga de cereal.
Alysson Paolinelli, presidente executivo da Associação Brasileira dos Produtores de Milho (Abramilho) e ex-ministro da Agricultura, reagiu com estranheza ao embargo da Petrobras. “Havia um trato de que alimentação básica não sofreria embargo. E o milho é um alimento básico. Estamos exportando 200 mil toneladas por mês e a nossa safrinha de milho este ano deve ser recorde. Vamos ser campeões de exportação, mas não é bom que surja uma exceção como nesse caso do Irã”, afirma.
Segundo Paolinelli, outra situação inusitada é o fato de os navios não estarem conseguindo abastecer. “A Petrobras não é a única empresa que abastece. Por que as outras empresas não estão abastecendo?”, questiona. O diretor-presidente da Abramilho afirma que entidades do setor estão tentando ajudar na resolução do impasse. “Estamos tensos, mas esperamos que a situação se resolva naturalmente.”
A expectativa é que a segunda safra de milho no Brasil ultrapasse 70 milhões de toneladas. Desse total, 40 milhões de t devem ter como destino o exterior – ano passado foram exportadas 30 milhões de t, segundo a Abramilho. Além do Irã, maior comprador do grão brasileiro, outros países do Oriente Médio e a China estão entre os principais destinos do cereal tupiniquim.
O caso surpreendeu também a Associação Nacional dos Exportadores de Cereais (Anec). “Qualquer sanção sobre comida está fora [das restrições americanas]”, reiterou o diretor-geral da Anec, Sérgio Mendes. A Anec, no entanto, não quis comentar mais detalhadamente o caso. Procurada pela reportagem da Gazeta do Povo, a Associação Brasileira dos Produtores de Soja e Milho (Aprosoja) também não quis se manifestar.
De qualquer forma, para o setor agrícola brasileiro, o impasse é uma péssima notícia, pois no primeiro semestre o Irã importou cerca de 2,5 milhões de toneladas de milho do Brasil, praticamente o mesmo volume importado em igual período do ano passado, segundo dados oficiais.
Aproximação com os EUA
O impasse com os navios ocorre no momento em que o Brasil busca uma aproximação com os EUA e o governo americano aumenta a pressão diplomática sobre o Irã. Em maio de 2018, Donald Trump retirou o país de um acordo que restringia o programa nuclear iraniano em troca da suspensão gradual das sanções.
Para o governo brasileiro, os cargueiros iranianos parados em Paranaguá representam um desafio. Em junho, durante a cúpula do G-20, em Osaka (Japão), o general Augusto Heleno, ministro do Gabinete de Segurança Institucional, garantiu que o Brasil não tomaria partido do lado americano de forma automática. “Não tem nenhuma rivalidade ou inimizade com o Irã. Pode ser parceiro em algumas coisas”, disse o general.
Além de ser o maior importador de milho do Brasil, o Irã é um dos principais clientes da indústria de soja e carne bovina. Consultada pela reportagem do jornal O Estado de S.Paulo, a empresa que exportou o milho para o Irã alega que o transporte de alimentos, remédios e equipamentos médicos estariam isentos das sanções. O abastecimento, segundo os exportadores, seria com combustível comprado por uma empresa brasileira junto à Petrobras.
A Petrobras confirmou o risco de ser punida nos EUA, por isso se negou a abastecer os navios iranianos, que estão na lista negra do Tesouro norte-americano. “Além disso, os navios vieram do Irã carregados com ureia, produto também sujeito a sanções americanas. Caso a Petrobras venha a abastecer esses navios, ficará sujeita ao risco de ser incluída na mesma lista, sofrendo graves prejuízos”, afirmou a empresa.
A estatal alegou que existem outras empresas com capacidade de atender à demanda por combustível para os cargueiros. No entanto, os exportadores brasileiros alegam que não há outra alternativa viável e segura para o abastecimento das embarcações, que dependem de um tipo específico de combustível cujo fornecimento é monopólio da estatal.”
Gazeta do Povo – 22/07/2019