O 1º Congresso Abramilho, realizado no dia 17 de maio, em Brasília, reuniu autoridades e especialistas para discutirem as perspectivas e os principais desafios da produção de milho no Brasil. O evento contou com a participação de diversos representantes do setor, que debateram a cadeia produtiva em 10 painéis temáticos ao longo do dia.
No período da manhã, os debates giraram em torno do cenário político pós-eleições; dos desafios a serem superados para a garantia da segurança alimentar; da implantação de novas tecnologias como aliadas de produção e dos problemas de infraestrutura que o país enfrenta.
Durante o painel “Cenário político pós-eleições”, o jornalista José Maria Trindade ressaltou a necessidade de comunicação e negociação entre o setor e o governo, abordando desafios como tributos, logística, infraestrutura, transporte, custo de produção e desperdícios.
“Os principais desafios passam pelo governo. O setor é independente, mas é importante negociar com o governo, exigir um retorno”, explicou.
Trindade disse que a reputação do setor depende da conscientização política e da comunicação. “A política é uma força que move e que, naturalmente, vai definir o futuro. Essa importância do agro tem que ser traduzida em força na sociedade”, explicou.
Milho brasileiro é referência internacional, mas ainda tem desafios a superar
Seguindo os debates, o painel “Segurança Alimentar: os desafios do abastecimento interno versus externo” contou com a participação do superintende da Companhia Nacional de Abastecimento (Conab), Thomé Guth; do presidente da Associação Brasileira de Proteína Animal (ABPA), Ricardo Santin; do presidente da União Nacional do Etanol de Milho, Guilherme Nolasco e do jornalista Rafael Walendorff como mediador.
Thomé Guth abriu o painel apresentando dados atualizados da Conab sobre o panorama do milho no país. O Brasil vive um momento de grande consolidação no mercado de exportações, com previsão de 48 milhões de toneladas exportadas em 2023, quase alcançado os Estados Unidos — atualmente, o maior exportador do grão. Já no mercado interno, Guth falou dos dois setores que consomem boa parte do grão produzido, o de proteína animal e o de energia.
O superintendente falou ainda dos desafios que precisam ser superados para que o agro brasileiro continue garantindo a segurança alimentar, como as questões de logística, armazenamento e a falta de inteligência de mercado.
Ricardo Santin reforçou o papel do setor de proteína animal como grande impulsionador do mercado interno de milho e apontou para a necessidade de estabilidade na produção brasileira, de contratos de vendas antecipadas e de segurança no mercado.
O presidente da UNEM, Guilherme Nolasco, falou sobre o setor do etanol de milho e seus desafios, incluindo a volatilidade de preços e a busca por segurança jurídica, de mercado e tributária.
Nolasco ressaltou a importância de produtores capacitados no Brasil para que haja mais investimento no campo e, consequentemente, aumento na produção. “Queremos produtores fortes. A área plantada cresceu mais de 50% na segunda safra nos últimos seis anos. A janela de plantio é pequena e o produtor estruturado tem como se preparar para aproveitar essa janela e crescer ainda mais a sua plantação”.
Produtores devem se aliar às novas tecnologias para aumento de produção e redução de custos
O terceiro painel do evento teve como tema “Inovação: soluções para alta produtividade”. Os convidados para o debate foram o diretor de marketing de sementes da Bayer, Luiz Marcio Bernardes e o presidente da Associação de Produtores de Soja do Mato Grosso do Sul (Aprosoja-MS), André Dobashi. O painel foi mediado por Cassiano Ribeiro, editor-chefe do Globo Rural.
Bernardes destacou a necessidade de inovação na agricultura para enfrentar os desafios crescentes da produção de alimentos. Ele enfatizou que a agricultura digital desempenha um papel fundamental nesse contexto, permitindo uma gestão mais eficiente das operações agrícolas e a tomada de decisões baseadas em dados precisos.
O diretor mencionou que a Bayer está investindo em tecnologias avançadas para impulsionar a produtividade e a sustentabilidade no setor agrícola. Estas soluções digitais permitem monitorar as condições do solo, a saúde das plantas e o clima, proporcionando informações em tempo real que ajudam os agricultores a otimizar o uso de recursos, como água, fertilizantes e defensivos agrícolas.
Durante o debate, André Dobashi, compartilhou exemplos concretos de como a inovação tem impulsionado a produtividade no campo. “A inovação é um apoio para que a gente opere com tecnologia e capricho para incremento da produção.” Ele destacou que a agricultura digital tem permitido um manejo mais preciso das culturas, resultando em maior eficiência na utilização dos insumos e redução dos impactos ambientais. Dobashi enfatizou a importância de incentivar a adoção dessas tecnologias pelos agricultores, tornando-as acessíveis e adaptáveis à realidade de cada região.
Armazenagem não cresce no ritmo do crescimento da produção brasileira e ainda é um grande gargalo no país
Para encerrar os debates do período da manhã, o painel “Infraestrutura: o principal gargalo para o crescimento do milho no brasil” trouxe o diretor da Abramilho, Paulo Bertolini; o secretário da Câmara Temática de Infraestrutura do Ministério da Agricultura, Carlos Alberto Bastos; o vice-presidente da Aprosoja-MT, Lucas Beber e a coordenadora de assuntos estratégicos da Confederação da Agricultura e Pecuária do Brasil (CNA), Elisangela Pereira Lopes. Desta vez, a mesa contou com a mediação do repórter da Folha de São Paulo, Mauro Zafalon. Ainda vistos como grandes problemas a serem superados, a falta de armazenagem e de logística no país foram os temas centrais no debate.
O presidente da Abramilho, Paulo Bertolini, ressaltou que o custo logístico do milho é alto e que a capacidade estática de armazenagem não acompanha o crescimento da produção brasileira. Bertolini lembrou ainda que estes são problemas antigos para os produtores. “O nosso desafio é entender cada aspecto dessas duas questões e buscar formas de reverter esse quadro. A falta de armazenagem é um fator que já está contribuindo para a redução do crescimento da produção.”
Lucas Beber, vice-presidente da Aprosoja-MT, disse que além de ajudar o produtor a equilibrar a precificação do seu produto, evitando oscilações mais fortes nos valores praticados, o armazenamento é uma questão de segurança alimentar, bem como de soberania nacional.
Segundo ele, Mato Grosso deve produzir aproximadamente 90 milhões de toneladas de grãos em 2023, e o déficit de armazenamento estático do estado é de 62 milhões de toneladas. “Isso faz com que os produtores tenham que vender na hora errada, diminuindo o preço do grão, trazendo outro reflexo negativo: o aumento do custo do frete, além de saturar as rodovias com caminhões para escoar a produção, colocando motoristas e passageiros de veículos menores em risco e causando maior desgaste às rodovias”. Beber ressaltou ainda a necessidade de investimento para a construção de ferrovias no país.
A representante da CNA, Elisangela Lopes, chamou a logística de “o grande vilão do agronegócio brasileiro” em termos de custos. Ela comparou o custo de transporte no Brasil com o de concorrentes, como Argentina e Estados Unidos, e ressaltou a necessidade de integração de diferentes modos de transporte para reduzir as despesas. Elisangela mencionou a importância dos rios brasileiros como uma possível solução logística e enfatizou a necessidade de uma política de estado consistente para garantir a continuidade das boas práticas.
Carlos Alberto Bastos, do Mapa, apontou que a agricultura no Brasil se desenvolveu antes da logística adequada, e falou da importância de ajustar a infraestrutura, especialmente no que diz respeito a ferrovias e armazenagem. “Espero que o Ministério da Agricultura possa oferecer condições para que o milho e o agro cresçam ainda mais”, concluiu.
Tecnologia e empreendedorismo devem ser temas cada vez mais trabalhados no agro
No painel “Inovação: transformação digital do agro”, Rafael de Tarso, palestrante e especialista em tecnologia, abordou a importância da transformação digital no setor agrícola. Ele destacou a necessidade de investimento em agricultura digital, trazendo a previsão de que até 2026 serão investidos cerca de 8,3 bilhões de dólares nesse segmento. Rafael ressaltou que a tecnologia não se resume à adoção das últimas novidades, mas sim à transformação de dados em inteligência e sabedoria, visando melhorias na gestão e na tomada de decisões estratégicas.
Diego Humberto de Oliveira, coordenador de inteligência estratégica da CNA, foi o palestrante do painel “Empreendedorismo: novas empresas e a mão de obra do futuro”. Ele enfatizou a importância do empreendedorismo no campo e destacou as tendências de consumo e as novas tecnologias que têm impactado a eficiência e produtividade no setor agrícola, destacando a agricultura 4.0 e a agricultura de precisão. Diego também destacou a necessidade de investimento em infraestrutura e a importância do desenvolvimento de habilidades digitais na população rural.
Claudia Alves do Valle Stehling, analista de competitividade do Sebrae, enfatizou a importância do empreendedorismo no campo e o apoio aos pequenos negócios no mercado. “Às vezes, as pessoas acham que o empreendedorismo é uma habilidade nata, mas isso pode ser formado, adquirido, estimulado”. Ela ressaltou a necessidade dos produtores enxergarem sua atividade como um negócio e destacou a importância do planejamento, controle de custos e receitas.
O debate foi mediado por Giovani Ferreira, do Canal Rural.
Durante o debate sobre “Biológicos: a tecnologia na construção de uma agricultura ainda mais sustentável”, Cristiane Da Roz Delic, da Corteva Agrisciences, abordou a importância dos biológicos na agricultura e destacou o crescimento desse mercado no Brasil, com adoção crescente pelos produtores. Segundo Cristiane, ainda é de extrema necessidade as soluções consistentes e confiáveis que agreguem controle e possam ser replicadas a longo prazo ao invés de uma solução biológica que funcione em uma primeira safra, por exemplo, mas que não será replicável no futuro.
Ela apontou ainda que o país se tornará a maior referência deste mercado. “O Brasil caminha a passos largos para ultrapassar a liderança da Europa e Estados Unidos em produção de biológicos”.
O painel também contou com a participação de Zilto Donadello, vice-presidente da Abramilho. Donadello destacou que o uso de produtos biológicos na agricultura não é algo recente, mas tem se intensificado nos últimos sete anos. “Os produtores enxergam essa tendência com bons olhos, pois percebem os produtos biológicos como uma questão de sustentabilidade”, explicou.
Donadello disse ainda que a agricultura está passando por uma transição e os produtores estão se adaptando às mudanças. Ele enfatizou que a indústria deve manter um padrão de qualidade, mas não deve retirar o direito do produtor de produzir. “É fundamental orientar o produtor para que ele possa realizar sua própria produção de biológicos”.
A mediação ficou por conta de Luis Patroni, do Canal Rural.
O painel “Manejo de pragas: desafio crescente”, mediado por Ederson Granetto, da Agro+. O gerente técnico de Inseticidas da Syngenta, Carlos Piotto, abordou as principais pragas que afetam a cultura do milho, com destaque para a cigarrinha e o percevejo de barriga verde. Piotto ressaltou a importância do manejo integrado de pragas, envolvendo estratégias como controle cultural, biológico e químico, além da necessidade de conscientização e trabalho conjunto para superar os desafios e garantir o sucesso no manejo de pragas.
“Temos que levar todas as estratégias de maneira conjunta. Não existe bala de prata. Precisa de conscientização, boa equipe para fazer manejo, usar o empilhamento de estratégias, tratar de uma maneira holística para que possamos superar com sucesso esses desafios”, explicou.
Representando o Ministério da Agricultura, o secretário de Defesa Agropecuária, Carlos Goulart, trouxe importantes reflexões sobre a cigarrinha do milho. Goulart ressaltou que, apesar de a praga estar presente no Brasil há mais de trinta anos, somente nos últimos seis anos é que ela se tornou um tema relevante de discussão.
O secretário falou sobre a importância de desenvolver uma ferramenta que possa identificar quais os problemas atuais do agro e quais questões podem se tornar problemas futuros.
Ele enfatizou ainda que o controle químico por si só não é suficiente para lidar com a cigarrinha do milho. “É necessário buscar materiais genéticos e soluções químicas para enfrentar essa praga, pois esperar até que ela se torne um problema significativo pode causar um grande impacto”.
Brasil trabalha em conjunto com Argentina e Estados Unidos para superar desafios internacionais
Um painel de grande destaque no evento foi o “Biotecnologia: o mundo pode se alimentar sem ela?”, mediado por Ricardo Ariolli, da CNA. Os participantes foram o presidente da Maizall, Federico Zerboni, o presidente da Maizar, Pedro Vigneau, o vice-presidente da U.S Grains Council, Cary B. Sifferath, a diretora da National Corn Growers Association, Sarah McKay e o diretor da Abramilho, Bernhard Kiep.
Os painelistas foram unânimes ao dizerem que o mundo depende da biotecnologia, especialmente quando a população mundial pode chegar a quase 10 bilhões de pessoas até 2050. Eles abordaram ainda o panorama do mercado internacional e as dificuldades enfrentadas com o governo do México — pela proibição das importações de milho geneticamente modificado — e com a União Europeia — pelo Due Diligence do Desmatamento e a Pegada de Carbono na Fronteira.
O diretor Abramilho, Bernhard Kiep, lembrou que os produtores brasileiros de milho correm o risco terem um aumento significativo no custo de produção em razão da possível suspensão de quatro defensivos importantes no combate às doenças no milho, numa conjuntura em que não existem substitutos eficazes e que poderá baixar a produtividade e elevar os custos de produção.
Para encerrar o 1º Congresso Abramilho, o palestrante Dado Schneider abordou as mudanças do século XXI, os conflitos geracionais expostos após a ascensão da internet e as dificuldades digitais ainda enfrentadas pelas pessoas mais velhas diante das diversas mudanças sociais e tecnológicas.
Schneider destacou a importância da aproximação entre as gerações e sobre como as gerações passadas não podem ignorar as novas mudanças que transformam o mundo.